Como se preparar para a Ceia do Senhor?

Em nossa igreja, sempre celebramos a Ceia do Senhor uma vez por mês, geralmente aos sábados. Temos esse dia como o culto mais importante do nosso mês. Nesse dia, todas as congregações se reúnem no templo central para compartilhar da comunhão e da mesa do Senhor. Os hinos e louvores são voltados para temas que apontam para a obra de Cristo e o pastor, que pode ser nosso pastor principal ou algum convidado, prega uma mensagem voltada para a cruz. Um momento muito especial que nos traz grande alegria e satisfação.

Somos uma igreja de linha pentecostal e entendemos que as denominações sérias têm, na Ceia do Senhor, o momento maior das reuniões de adoração. Em outras palavras, para os crentes e igrejas sérias, a mesa do Senhor é tratada com zelo. Esse zelo faz com que esperemos por esse momento, seja ele semanal, quinzenal ou mensal. Da mesma forma que ansiamos pela vinda do nosso Senhor, devemos também ansiar por participar da santa reunião junto à santa congregação.

 

Olhando para o passado

Quando pensamos na preparação para o momento da Ceia, é muito importante que olhemos para trás. Os exemplos da igreja na história ainda falam bem aos tempos modernos. Aliás, a igreja cristã tem mais de 2000 anos de história. Coisas boas e ruins foram feitas antigamente e tudo passou pelo teste do tempo. Então, ao invés de reinventarmos a roda, podemos olhar para a história da igreja e copiar os bons exemplos. É quase impossível falarmos de preparação para a Ceia sem lembrarmos dos puritanos. Entre todos os tipos de pessoas que compuseram a igreja, os puritanos eram crentes que se preocupavam muito com zelo, consagração e devoção. Eram homens de oração, que se preocupavam muito com a leitura e ensino das Escrituras. Realmente eram gigantes de seu tempo, ainda que humildes servos de Deus que, enfrentando várias lutas, perseveravam pela verdade do evangelho.

 

Quem eram os puritanos?

Segundo Earle E. Cairns, em seu livro Cristianismo Através dos Séculos, os puritanos surgiram no século XVI e, na Inglaterra, tentaram purificar a Igreja Anglicana conforme a Bíblia, aceita por eles como regra infalível de fé e prática. Por isso, receberam a alcunha de puritanos a partir de 1560. Earle diz que:

“Eles se opunham à guarda dos dias santos, à absolvição clerical, ao sinal da cruz, à presença de padrinhos no batismo, ao ajoelhar-se na hora da ceia e ao uso da sobrepeliz pelos ministros. Também deploravam a observância relaxada do domingo por parte dos anglicanos”.

“Eles davam testemunho da soberania de Deus na redenção amorosa de Cristo sob a nova aliança, encorajavam a meditação na Palavra inspirada e normativa de Deus, destacavam a transitoriedade da vida, insistiam na necessidade de constante reforma e promoviam a teologia que tinha como propósito amolecer o coração e iluminar a consciência”.

(Cristianismo Através dos Séculos Uma História da Igreja Cristã, Earle E. Cairns, Edições Vida Nova, 3ª Edição, 2008, pág. 303).

Esses homens de Deus tinham a teologia como o centro de sua vida e adoração. Isso moldava a forma com que eles ofereciam o culto a Deus. E isso, logicamente, influenciava o espírito com o qual eles participavam da Santa Ceia. Isso também nos ensina sobre o culto moderno: a maneira que enxergamos a Deus influencia a forma com que cultuamos.

Existe muito a falar sobre os puritanos e também sobre os separatistas, porém, para fins do nosso estudo, isso já nos é suficiente.

 

Como se Preparavam

Os puritanos tinham grande zelo com a preparação para os cultos, principalmente com a Ceia do Senhor. A preparação, geralmente, era feita por toda a semana que antecedia o culto. Ou seja, ao terminar o culto de domingo, eles já começavam a se preparar para o próximo domingo, que seria o da Ceia. É claro que o calendário e os intervalos de tempo entre uma Ceia e outra mudavam, dependendo da comunidade, mas, por norma, era isso. Não era a preparação de somente um dia, mas sim de uma semana. Isso, geralmente, era trabalho dos líderes das famílias, que discipulavam seus filhos e esposas na graça e verdade de Cristo.

 

Oração

“Orem no Espírito em todas as ocasiões, com toda oração e súplica; tendo isso em mente, estejam atentos e perseverem na oração por todos os santos.”

Efésios 6:18 NVI

Uma das coisas que mais nos chama a atenção quando estudamos sobre os puritanos é a oração, e isso não era diferente quando pensamos em preparação para o culto. Se os puritanos oravam muito, quanto mais na preparação para a Ceia. Essas orações durante a semana eram feitas individualmente e também em grupo, com a família e a congregação. A oração preparava o coração daqueles crentes para o momento especial do culto. Quando chegavam ao local de adoração, o coração já estava transbordando de graça e poder. Eles oravam orações como esta:

“Na ceia relembro Seu amor eterno, graça ilimitada, infinita compaixão, agonia, cruz, redenção, e recebo garantia do perdão, adoção, vida, glória. Como os elementos externos nutrem meu corpo, assim possa teu Espírito interiormente revigorar minha alma, até aquele dia quando não mais terei fome ou sede alguma, e me assentarei com Jesus aos Seus pés divinos.”

(O Vale da Visão, Coletânea de Orações Puritanas editada por Arthur Bennet, pág. 197).

Ir para um culto sem preparar o coração com oração é não dar atenção para o que irá acontecer lá. O coração do adorador, como nos ensinaram os puritanos, deve ser preparado antes de pisar a soleira da porta do templo.

 

Confissão

“Examine-se o homem a si mesmo, e então coma do pão e beba do cálice.”

1 Coríntios 11:28

Se a oração preparava o coração do puritano para o culto, a confissão de pecados preparava sua alma para o louvor e a adoração. Para eles isso era um profundo autoexame. Esses homens e mulheres eram muito apegados à devoção, por isso, concluímos que eles eram mais sensíveis à atuação do Espírito Santo. Eles sabiam que não podiam participar da Ceia do Senhor indignamente (1 Co 11:27) e essa verdade aumentava o seu zelo.

É claro que eles sabiam que toda a dignidade para a participação da Ceia era dada a eles por intermédio de Cristo, mas isso não retirava deles o fardo e a incumbência da confissão. Muitos deles oravam confessando os pecados horas a fio. Eles viviam em um tempo onde não havia muitas distrações, como na época moderna. Por isso, as orações eram levadas a sério e muito tempo era gasto (ganho) com isso. Isso mais uma vez é evidenciado em orações como essa:

“Tens preparado para mim um banquete; e, embora eu não seja digno de tomar assento como um convidado, confio tão somente nos méritos de Jesus, e me escondo debaixo da Sua justiça”.

(O Vale da Visão, Coletânea de Orações Puritanas editada por Arthur Bennet, pág. 197).

 

Ensino

“Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça…”

2 Timóteo 3:16 NVI

Os puritanos também tinham grande zelo pelo ensinamento da Palavra. Richard Baxter, por exemplo, foi um líder puritano que pregava aos domingos e, durante a semana, visitava sua congregação, família após família, ensinando a palavra de Deus aos líderes do lar, mulheres e pequeninos. Quando ele visitava as famílias, realizava o trabalho conhecido como ensino catequético. O objetivo era despertar a consciência dos membros e o compromisso com uma vida santa. Isso era realizado pelos puritanos também no contexto da Santa Ceia. Quando o momento da Ceia se aproximava, o ensino era focado nisso, logicamente sempre respeitando o calendário de cada igreja ou comunidade. Mas será que tanto zelo ao ensino abençoou sua congregação? Veja o que ele disse sobre isso:

“Usualmente, a congregação vivia cheia, pelo que tivemos de construir cinco galerias, depois que ali cheguei… [o templo abrigava cerca de mil pessoas, sem as galerias]. Nossas reuniões particulares também eram muito concorridas. No dia do Senhor não se via qualquer desordem nas ruas, mas podia-se ouvir uma centena de famílias entoando salmos e repetindo sermões, quando passava pelas ruas. Em poucas palavras, quando ali cheguei pela primeira vez, havia cerca de uma família em cada rua que adorava a Deus e invocava o seu nome; e quando saí dali, em algumas ruas, em quaisquer de seus lados, não havia uma única família que não O louvasse, ou que, por meio de sua piedade professa e séria, não nos desse esperança de sua sinceridade. Quando organizei entre eles conferências pessoais e catequese, houve bem poucas famílias, em toda a cidade, que recusavam vir e participar… [Baxter as convidava para visitarem-no, em sua casa]. Poucas famílias encerraram sua visita a mim sem verterem alguma lágrima, ou parecendo ser candidatos sérios a uma vida piedosa.”

O Deus que mudou a igreja de Richard Baxter através do ensino ainda continua atuando em nossos tempos. Oração e ensino sempre foram e sempre serão a base de um ministério eficaz.

 

Conclusão

Como escrevi no começo desse artigo, existem coisas do passado que deveríamos copiar porque evidentemente deram certo. São demonstrações de zelo e fervor pela Palavra de Deus e pela sã doutrina. Oração, confissão e ensino deveriam ser atividades que precedessem a Santa Ceia. Acredito que muitos cristãos de nossa época já façam isso, mas será que isso é motivado pelas igrejas? E será que isso é feito espontaneamente? Seria bom sempre relembrar, durante a semana, do sacrifício de Cristo, aproveitando os momentos corriqueiros de avisos durante o culto, por exemplo.

Podemos usar também as rede sociais para esse fim. Podemos escrever artigos, devocionais e gravarmos vídeos curtos para incentivar os membros da congregação para o momento do culto. Isso é usas as ferramentas que Deus nos deu para abençoar o reino.

Os líderes devem preparar o coração do povo para a adoração. É papel do pastor guiar a ovelha até o aprisco. A igreja, por sua parte, deve entender que culto é algo sério e também se voltar à oração e confissão. Assim, quando chegarmos na Ceia, nosso coração já estará aberto para receber dos sacramentos e da Palavra de Deus.

 

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